SÃO PAULO – Ele tinha alguns ferimentos no pescoço e também uma pequena hemorragia no olho esquerdo.
Segundo a polícia, ele percorreu 25 km entre as zonas Sul e Norte da capital paulista. Transtornado, roubou carros, provocou acidentes, deu tiros a esmo e feriu duas pessoas. Em entrevista coletiva na delegacia, o acusado disse que atirou contra as pessoas porque queria entrar nos carros para fugir
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FANTÁSTICO
http://fantastico.globo.com/Jornalismo/FANT/0,,MUL1677842-15605,00-ARTISTA+PLASTICO+SE+ARREPENDE+DE+DIA+DE+FURIA+SO+QUERO+VIVER+E+CUMPRIR+PENA.html
Veja passo a passo como foi que esta semana um homem saiu roubando carros e dando tiros pelas ruas de São Paulo. E mais: qual teria sido a motivação dele pra cometer esse absurdo?
A ação foi impressionante. Dez veículos batidos. Pelo menos 18 vítimas, duas feridas por tiros. Mais de 30 disparos. Tudo em cerca de 20 minutos, na manhã da última segunda-feira (09).
Só dois dias depois, se entregou à polícia e explicou o motivo de tanta violência: ele estaria sendo perseguido. Fugia para salvar a própria vida. “Eu não quis ferir ninguém, eu quis me proteger, entendeu?”.
O desespero teria começado por volta das 4h da manhã de segunda-feira (09). Ele suspeita da presença de estranhos no quintal. Chama um vigia. Nada de estranho é encontrado, mas não se convence.
“Eu comecei a ouvir barulhos, barulho dos cachorros latindo, e sentia que alguma coisa ia acontecer. E daí eu peguei e desci para pegar minhas coisas para poder sair e bater em fuga, para preservar minha vida”, conta.
Sai dirigindo o próprio carro. O porteiro vê que ele usa um colete à prova de balas. E segura uma arma.
Pouco antes das 5h, sai com o carro do condomínio e parte para o que ele chamou de uma fuga desesperada. Ele segue por 46 quilômetros - de Cotia a São Paulo. Para na Avenida dos Bandeirantes.
Sobe com o carro sobre uma calçada e estraga a roda. Ele então para e desce. Para seguir fugindo, precisa de outro veículo. Armado, ele tenta roubar um táxi, que escapa. Mas logo em seguida aborda outro taxista.
“Ele apontou a arma pra gente no farol e falou: ‘Desce do carro!’. Eu fui destravar ele já disparou duas vezes. Aí eu gritei: ‘Calma!’”, conta o taxista Elias da Silva.
O taxista e a passageira saem do carro. Com o táxi roubado, continua a fuga. Mas só por sete quilômetros. Por volta de 5h30, horário em que já há bastante movimento num cruzamento, provoca um acidente. Segundo testemunhas, ele bate de raspão em um terceiro táxi.
Depois, acerta outro carro, onde estão um casal e um bebê de dois meses.
“Foi uma pancada muito forte. A gente pensou que era um caminhão”, conta David Neves, técnico de instalação de TV a cabo.
O automóvel do casal cruza a avenida e para no canteiro central. Aborda mais um carro, onde estão um eletricista e a mãe. Atira quatro vezes - o homem é atingido no abdômen. Ele ainda está hospitalizado, mas não corre risco de morte.
Tenta roubar o veículo, mas não consegue dar a partida. De acordo com testemunhas, ele sai alucinado, disparando contra os motoristas que tentam fugir. Mas nem todos conseguem.
“Eu deitei, pus a cabeça pra porta. Só raspou (no braço)”, conta o engenheiro químico Ademir Guerretta.
No meio do tiroteio, a polícia recebe pedidos de socorro.
“Tem um cara com uma arma na mão atirando igual a um louco”, diz uma testemunha.
As colisões e disparos não param. Depois de bater em um ônibus, rouba mais um carro. À frente, nova batida, outro roubo. A confusão só termina 23 quilômetros depois do primeiro carro que ele roubou.
Na Marginal Tietê, bate de novo. Ele desce do carro, caminha até o rio, pula o muro de proteção e se esconde nas tubulações de esgoto.
Um helicóptero da polícia e 12 viaturas o procuram . Ele fica escondido por 12 horas.
“Eu ouvi as vozes de pessoas e tal conhecidas. Não ouvi mais, eu falei: ‘Elas foram embora’. Então eu disfarcei que eu tinha morrido, fui me arrastando pelo cano, até cair no rio. Uma luta pela vida mesmo”, conta .
Segundo ele, os perseguidores eram vizinhos do condomínio, que reclamavam do barulho dos dez cachorros do artista plástico. Ele chegou a denunciar à polícia um vizinho que teria jogado pedras na casa dele.
“Todas as vezes que os cães latiam com mais intensidade, ele achava que alguém estava invadido o quintal da sua residência, da sua chácara, e estaria lá para matá-lo”,diz o delegado Marcos Antônio Manfrin.
Para psiquiatra forense Daniel Barros, o comportamento de Michel pode indicar um surto psiquiátrico. “Então uma briga de vizinho, uma desavença, uma animosidade, na cabeça de uma pessoa já vira uma perseguição, uma coisa perigosa para a vida dela”.
Michel mora sozinho em uma casa num condomínio de luxo. Parentes disseram à polícia que ele só recebe a visita da namorada e aos fins de semana. Formado em administração de empresas, não exerce a profissão. Vive de investimentos e do dinheiro da família. É em casa que passa a maior parte do tempo, cuidando dos cachorros e pintando quadros - como os que doou a um hospital de São Paulo.
A polícia ainda procura a pistola calibre 380 de Michel. Ele diz que ela se perdeu na fuga. A arma estava irregular porque o artista plástico não fez o recadastramento obrigatório em 2009. Michel foi indiciado pelos crimes de tentativa de latrocínio, tentativa de homicídio, lesão corporal, disparo de arma de fogo e porte ilegal.
Os novos advogados, contratados pela namorada e pela família, ainda estudam a estratégia de defesa. Mas afirmam que as acusações contra Michel são pesadas demais.
“É inimaginável que ele quisesse roubar para matar, ou matar pra roubar. Isso tudo tem que ser aferido pra ver se ele agiu com aquilo que nós chamamos de dolo, da vontade de praticar o crime, ou se tratava de uma pessoa confusa mentalmente falando”, argumenta o advogado Alberto Toron.
Em entrevista exclusiva ao repórter Valmir Salaro, Michel disse arrependido. " Nem tudo é fácil de você provar, infelizmente”.